Em decorrência da pandemia global do coronavírus, muitos países estão adotando um regime de quarentena e isolamento social visando conter o avanço da doença.
Esse posicionamento teve diversas implicações no comportamento dos consumidores e principalmente na economia de modo geral, em decorrência da mudança no perfil do consumo e redução de gastos.
Na medida em que a população permanece em casa, saindo apenas para atividades essenciais, a dependência da tecnologia aumenta , impactando a frequência de compras online, o uso de plataformas de videochamada, o consumo de serviços de streaming, o uso das redes sociais e o uso de aplicativos de Delivery.
Como consequência, o aumento do consumo de internet causou mudanças no padrão de tráfego na rede. O volume de dados usados em conferências de vídeo, serviços de streaming, notícias e sites de comércio virtual subiu consideravelmente desde a declaração da pandemia, principalmente analisando os países mais afetados. Com muitas formas externas de entretenimento fechadas, a população acaba passando muito mais tempo online e consumindo muito mais serviços online.
No Brasil, o efeito da quarentena também mudou os hábitos de consumo de internet. Os profissionais passaram a trabalhar em casa através acesso remoto e reuniões online. Estudantes passaram a cumprir as cargas horárias de escolas e universidade acompanham videoaulas por plataformas como Zoom, Google Meet and Microsoft Teams.
A demanda pelas formas de entretenimento também cresceu, o uso de videogames conectados aumentou em 60%, o consumo de conteúdo por streaming de vídeo cresceu 120% e o tráfego devido ao uso de redes sociais alcançou um crescimento de quase 100%
A GlobeNet, provedora de infraestrutura de telecomunicações que mais cresce na América, compartilhou suas informações sobre o tráfego de internet referente ao período de duração da pandemia.
De acordo com a provedora, o consumo de dados da internet na América Latina dobrou. Apesar do grande número de pessoas conectadas, trabalhando remotamente durante o dia, o pico de consumo permanece entre 18hs e 2hs.
Em comunicado oficial, o IX.br (Brasil Internet Exchange), projeto do Comitê Gestor da Internet no Brasil que promove infraestrutura dos Ponto de Intercâmbio de Internet, informou que apesar do aumento do tráfego, a rede está preparada para suportar as mudanças.
A infraestrutura brasileira de internet registrou um fluxo de tráfego de 11 Tb/s em 23 de março. O valor é considerado alto e atípico: a média de terabits por segundo registrada ao longo de 2019 foi de 4,69 Tb/s.
A tendência não se limitou ao Brasil, em outras países como o Reino Unido, o tráfego aumentou em 30% nas três primeiras semanas do mês de março. e nos EUA, o aumento foi de cerca de 20%.
Para manter o bom funcionamento das redes sociais e plataformas de entretenimento, que estão recebendo um número superior de usuários simultâneos em relação as condições normais, os provedores tiveram de tomar algumas medidas.
O YouTube, anunciou que irá reduzir a qualidade automática dos vídeos, priorizando a exibição destes em qualidade padrão, para diminuir a carga de internet e deixar a plataforma mais leve.
O Facebook e o Instagram, que já haviam feito uma redução da resolução em bits em países europeus, também anunciou, em nota para a imprensa, que as novas medidas passarão a funcionar na América Latina.
Em comunicado, a Netflix anunciou a redução da qualidade de exibição de seus conteúdos a partir do dia 21 de março, a fim de tentar diminuir a sobrecarga de seus servidores em até 25%.
Essa medida está sendo aplicada em vários países da Europa, podendo se estender aos demais países, de acordo com a demanda.
Em decorrência do crescente uso de serviços de streaming, a Netflix, teve suas ações valorizadas em cerca de 9% somente no mês de março de 2020, registrando seu pico mais alto desde a abertura do serviço de streaming ao público.
De acordo com dados da Sensor Tower, uma empresa de dados de aplicativos, o número de downloads do aplicativo da Netflix aumentou 66% na Itália, 35% na Espanha e 9% nos EUA, onde o serviço já era muito popular.Nos demais países, ainda não há dados divulgados e a empresa não quis comentar se o número de assinantes também aumentou. Certamente, a Netflix se valorizou bastante nessa crise, com seu valor de mercado atingindo cerca de US$ 158 bilhões e superando os US$143 bilhões em 2019.
Assim como a Netflix, outros concorrentes da categoria também sofreram impactos positivos em relação ao aumento do tráfego e ao aumento das assinaturas.
A Disney Plus, com apenas 5 meses de funcionamento desde o seu lançamento, ultrapassou 50 milhões de assinaturas, um resultado bastante surpreendente, se considerarmos a expectativa da empresa de alcançar 60 milhões de assinaturas em 5 anos. Em fevereiro – período anterior à pandemia do coronavírus – a Disney Plus possuía apenas 28,6 milhões de assinantes.
O Hulu, disponível apenas no mercado americano, possuia cerca de 28,5 milhões de assinaturas em Novembro de 2019. Como consequencia da crise, a Hulu também passou por um crescimento acelerado entre os meses de março e abril, chegando a 30,4 milhões de assinaturas ao final de Abril.
A Amazon Prime, ainda não divulgou dados referentes ao crescimento durante o período de isolamento social, entretanto, de acordo com o portal Business Insider, somente na Itália, a taxa de novas instalações do serviço aumentou em 101% no meio de Março.
Os reflexos do período de quarentena na indústria de games não é diferente da de serviços streaming, a Steam — plataforma online de jogos eletrônicos — registrou seu recorde de acessos simultâneos na última semana. A plataforma atingiu um número 22 milhões de usuários.
Segundo dados da própria Steam, o serviço atingiu o pico de 24,5 milhões de usuários simultâneos no dia 4 de abril. Anteriormente ao período de isolamento social, a maior marca era de 18,8 milhões de pessoas, atingida em 2 de fevereiro de 2020.
Ainda é cedo para prever o fim da crise, apesar de muitos lugares no mundo estarem apresentando sinais positivos. Entretanto, já está se formando um consenso que muitas das atividades habituais de antes, principalmente trabalho, educação, lazer e comércio, serão profundamente modificadas pela crise.
A crise mostrou para muitas pessoas e empresas que é perfeitamente possível trabalhar mais de casa, sem perda de produtividade. Apesar de que isso, certamente, não serve para muitas profissões. A crise mostrou também que as pessoas acham meios bem criativos de formar comunidades online e manter o relacionamento com colegas via videochamadas.
Certamente, uma preocupação enorme nesse novo cenário, é o fato que muitas pessoas tem pouco ou nenhum acesso à Internet, ou pouco acesso a conteúdos de qualidade. No setor educacional, isso é especialmente preocupante, pois escolas com menos recursos não têm condições de oferecer video-aulas a seus alunos, e mesmo quando têm, muitos alunos não têm um computador em casa que permita acompanhar as aulas.
O futuro certamente será diferente, e a responsabilidade de todos – pessoas, empresas e governos – é garantir que a crise não piore ainda mais as diferenças sociais.
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